Naquela tarde quando me dei por
recebe-lo, fiz da minha vida um de tudo, sabedora do curto das horas. Sabia que
seria o tempo de uma garrafa de vinho de taças em par, uma tarde de jour. Claro
que havia duas garrafas a mais no armário da cozinha, só não desejava que minha
ansiedade pudesse ser comprovada no meu refrigerador, não com ele, que sempre
se fazia tão apressado, dizendo tenho duas horas.
Também queria ser assim, apressada.
Mas meu tempo era o de antigamente. Nas duas horas para ele, passava semanas
inteiras a pensar, hora e meia na manicure, cinco horas de faxina no meu apartamento,
duas horas na depiladora e o tempo que se gasta para se ter uma epifania sobre que
lingerie usar.
Se eu narrasse a tarde toda, você
poderia achar que sou afeita a esses encontros. Não é o caso. Só agora me
permiti. Minhas amigas, as de longa data, sabem do que estou falando. Sabem,
inclusive, que o tom dessa minha narrativa poderia ser cômico, como se apenas eu
pudesse rir de mim mesma. E apenas para mim e para elas, confesso.
Confesso que naquelas duas horas, do
momento em que ele tocou na minha campainha e chegou todo ligeiro, afoito numa
tarde de outubro, como se só tivesse me visto em fevereiro, tive receio de que
não me reconhecesse em maio, de que passasse pelo umbral da porta em julho,
cruzasse a ante sala em agosto e deitasse na minha cama em setembro, tivesse finda
as duas horas em novembro, quando o tempo se revelasse o de um ano inteiro.
Ije, disse, enquanto ele estava
sentado no meu sofá de algodão e passava uma mão por entre os seus cabelos,
enquanto a outra ocupava de segura-lo pelo queixo. Escolhi essa calcinha para
você.
Ele rapidamente se refez. Deu mais um
gole no vinho ainda frio. E me olhou profundamente, enquanto dizia, nunca a vi
tão bela, tão bela. Quero beijá-la até sentir seus lábios tremerem, como se ali
fosse um rosto, afogueado, de todo ardente, quando me disse infinitos ardores e
me declamou todos os fervores.
Seria assim minha narrativa, se fosse
por acaso publiciza-la.
Mais do
momento em que disse ije, depois da ante sala, no som de Born to die, que
comprei a duras penas, retruquei como se soubesse inglês,
Keep
making me laugh
Let's go get high
Road's long, we carry on
Try to have fun in the meantime.
Ele
nem ao menos ouviu ou me ouviu. Tampouco sabia inglês. Mas não era de todo
despido de sabedoria. Sob o fundo inglês, o algodão, a fábrica, riu gostoso e
indagou sobre o tempo, sobre as dobras, sobre as intensidades, fazendo do vinho
e da música o que nem eu sabia ser capaz.
Pegou
no nude da minha roupa intima e fez milhões de tricôs. Desse tricô, que brincou
como se fossem pelos púbicos, fez tranças. Das tranças que teceu, fez cordas,
que debaixo para cima, ia escalando, com se seus dentes a fincar as minhas
coxas, fosse a melhor aplicação do dry looling.
Enquanto
ele falava com minha lingerie, já desfigurada, posta de lado, disse para ela,
como ela era úmida, gostosa, farta, intumescida na mão e na boca, como uma
verdadeira buceta devia ser.
Eu
não sei o que sentir, nem ao menos o que dizer as minhas amigas. Senti que naquele
momento em que ele fez um monologo com ela, falava a mim e a todas depois de
mim, mais que eu queria que fosse sobretudo a mim. E como eu odiei as que
vieram depois de mim, odeie apenas, naquele momento único, em que ele me beijou
como se fosse a única buceta possível de tanta sede, como se minha buceta o
fartasse e não fosse tudo.
E,
talvez, numa tarde qualquer, quando eu quiser fuder, ligue pra ele, e diga,
você tem duas horas, venha e me coma, nem fale muito, só tenho duas horas. E estou
sem lingerie.
Da
ultima vez que publiquei, meu filho disse, pra um conto, você escreve muito
pouco, pra isso é excesso. E assim...