terça-feira, 11 de junho de 2013

Solturas


Era assim, solta no mundo. Era tanta soltura, que não, nunca pensara em se apegar a nada. Costumava olhar de longe, os apegos dos outros. Era na rua, era na escola, era em casa, era consigo, sempre indo. Os pais sabiam, quando não perguntavam, todas as filiações. E distantes, sempre estavam. Era assim, totalmente, tolamente, enraizada.

Por isso nunca estranhara, nunca estranhara a distância, nem o enviesamento que estava. Não estranhara quando deu a primeira vez, sem emoção nenhuma, sem sangue, sem hímen, sem vergonha, sem prazer. Estava tudo certo, como certo eram as contas do mundo.

Detestava as raízes todas e não por acaso tinha a insistência de arrancar as folhas por onde  as encontrava plantadas, tão arvoreadas. Via-se plena, quase sempre absoluta. E um dia ela me viu, me viu, como se olhasse de lado, como se olhasse desconfiada, como se nem acreditasse.

Olhando-me, assim de banda, sem nem acreditar decerto, como um vislumbre, totalmente, tolamente ensimesmada, me puxou pra dançar, naquele buteco e me disse: - você tem um cheiro bom, cheiro de vinho barato.

Eu me senti bacana, fiz os rodeios todos, e baforei mais um tanto, incendiado que estava. E a puxei pra dançar, enfiando os pés por entre as pernas dela, como se pudesse controlar o ritmo das vontades.

As pernas dela eram longas, fortes, daquelas acostumadas aos mil passinhos. Na sua troncura, me segurei e pensei  -  que se danem todos os ritmos, as quero ao meu derredor. Quero uma coroa de pernas para com elas me deitar e ser rei.

E, olha só, ela nem sabia, mas eu já a via visto. Já tinha visto a veia azul dos seus seios, como a mandar pra mim, de tão longe, o recado, aqui se soma a abundância das terras que sabem ser férteis. E, sedento que estava, faminto até, me fiei, como quem é enredado nas histórias das mil e uma noites, pensando apenas, com você, nessa noite de fome, com tanta gula sentida, me farto de fastio.


Ela, sem entender direito, me devolveu e soltando se foi... assombrando meus dias. E, tolamente, fiquei, a senti-la tão absurdamente...